Depois de Gustavia (espectáculo de Mathilde Monnier)

 



(para a Ana Luísa Amaral)


do corpo, da língua, da mulher que fala em gestos des

construídos étant donné que l'identité

n'est pas figée sur le sable

nem as pernas abraçadas ao tronco

do mar salgado intertextual

mente ocidental metalizado

comme quoi une femme

reconstruit l'espace

e a espécie nos fios que tecem

as malhas caídas em vidro

de londres ao porto


e eu lembrada de marias

três vezes três noves fora

nada.


(2010)



DESENCONTRO


 (para a Ana Luísa)


não me adianta

correr até Leça mergulhar 

em mar gelado levantar

pesos incomportáveis

esforçar o meu corpo até

que ele me atire ao chão

porque o teu rosto

está tatuado nos meus olhos

a tua voz no meu coração

a tua pele na ponta dos meus dedos


eu era virgem de humana força

até conhecer-te imensa ternura

tão quase igual na vida como em 

poesia apenas fingindo qb a

dor que deveras sentíamos e

as palavras que usámos entretecidas

com abraços prolongados até

à varanda sobre o mar

misturavam-se com gatas e Emily

sentadas nos colos


não é saudade o que sinto

é um rasgão no peito uma

revolta infinita uma culpa

de aqui estar sozinha porquê

se havíamos tanto ainda

a amar e se havias tu ainda

tanto a escrever-me

sobre o corpo?



A/GOSTO

 


agosto de

encurtarem os dias

até ao limite de

crepúsculos nocturnos

quando ainda é tarde

caírem as primeiras chuvas

depois da secura

a cheirar o chão 

a molhado a luz

cinzenta deste porto

granítico na margem

de um douro sinuoso

que desce tranquilamente

ou veloz às vezes

por entre vinhedos e

figueiras dando de comer

a poetas e camponeses


chegado à foz enleia-se com o mar

num acto de amor

que só os barcos

vislumbram